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Recesso ao mar

No ano de 2023 mais de 01 milhão de pescadores artesanais receberam o seguro-desemprego. O famoso seguro defeso…

No ano de 2023 mais de 01 milhão de pescadores artesanais receberam o seguro-desemprego. O famoso seguro defeso.

O Maranhão é o segundo maior concessor desse benefício no Brasil, perdendo somente para Estado do Pará. São mais de 200.000 pescadores maranhenses que recebem anualmente. O montante passa da cifra de 01 Bilhão de reais só no nosso Estado.

Embora seja uma compensação remuneratória pela proibição do exercício da atividade pesqueira – portanto, um seguro-desemprego pago pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador- é o INSS o órgão competente para analisar os critérios para sua concessão.

O seguro defeso é um benefício pago pela União pelos meses em que o pescador profissional artesanal está proibido de pescar determinadas espécies marinhas, lacustres ou fluviais em algumas regiões do país. 

O IBAMA fixa as áreas, os produtos e o período em que algumas espécies da fauna são protegidas para garantir a reprodução. A chamada época da piracema, que dura em média de 03 a 05 meses por ano.

Aqui no Maranhão, começando em novembro de cada ano, espécies como caranguejo, camarão sete barbas e peixes de água doce são alguns exemplos protegidos para reprodução em regiões como as bacias hidrográficas dos rios Pindaré, Maracaçumé, Mearim e Itapecuru.

O principal propósito da medida é justamente a proteção do meio ambiente, garantindo a perpetuação de espécies exploradas pelo homem no exercício da atividade pesqueira. Belo propósito!

Mas por outro lado, quem sobrevive da pesca artesanal fica sem renda para se manter. 

E a Constituição garante o direito tanto a um meio ambiente ecologicamente equilibrado quanto a liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, incluindo, claro, a de pescador.

À primeira vista, então, o cenário fica desenhado como se o lençol puxasse de um lado e ficasse descoberto em outro.

Aí entram as políticas públicas de proteção pelo Estado. E como na maioria das vezes, o INSS está no meio. 

Assim, o seguro defeso surge como mecanismo de proteção ao trabalhador pescador artesanal diante do desemprego involuntário.

E esse é um emblemático exemplo para se perceber o quanto há uma espécie de orquestra normativa no direito – historicamente segmentado em vários ramos para fins didáticos -, mas cujas partes devem tocar sempre a mesma sinfonia, qual seja a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, além de tantos outros objetivos consagrados no art.3º da Constituição Federal de 1988.

Não causa surpresa que em determinadas ocasiões alguns interesses devam ceder para que outros floresçam. Numa sinfonia, alguns instrumentos se calam por um tempo para que outros possam demonstrar toda a sua razão contemplativa, aumentando e diminuindo os ritmos, tons e participação de cada um deles em compassos administrados minunciosamente para que a orquestra baile com toda sua perfeição.

E assim não pode ser diferente nas relações sociais. Principalmente nas mais complexas, como a nossa.

Para isso, o poder público deve ter não somente a boa vontade, mas a capacidade técnica, a parcimônia e a coragem para adotar medidas por vezes invasivas nas relações sociais mais delicadas, com soluções como a do seguro defeso, garantindo que passos evolutivos sejam dados, ainda que sacrificando determinados bens jurídicos por um período.

É dizer, proibir o exercício da atividade pesqueira pode soar em primeiro tom como medida rigorosa demais, principalmente para o pescador artesanal que exerce a atividade em regime de economia familiar ou individual e retira todo seu sustento dali.

Do outro lado, pesam incontáveis espécies marinhas, lacustre e fluviais clamando pela sobrevivência mínima, cuja garantia somente é possível abortando atividades predatórias nos períodos mais delicados de reprodução.

O raciocínio para a ponderação desse choque de interesses leva em consideração uma perspectiva mais ampla, sob o aspecto temporal. Ao longo dos anos, a ausência de intervenção do Estado certamente desembocaria na extinção de diversas espécies animais e até mesmo o pescador perderia seu principal objeto de trabalho.

Perderiam todos. O meio ambiente e o homem.

 Por isso, sacrifícios devem ser suportados. Nesse caso, tanto com a proibição do exercício de eventuais trabalhos, ofícios ou profissões, quanto pela despesa bilionária estatal ao suportar o ônus do pagamento do seguro pelo desemprego involuntário.

Mas uma coisa permanece intocável em homenagem ao tempo, à sobrevivência e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; o recesso ao mar.

Imagem: Pexels

Autor

Ibraim Djalma

Formado em direito pela Universidade Federal do Maranhão, aprovado nos concursos pra procurador de fazenda nacional e procurador federal. Foi assessor no TRF1. Procurador Chefe do INSS do Maranhão e membro da Equipe Nacional de Consultoria de Benefícios. Professor de direito previdenciário, criador de um método dinâmico, prático e eficaz para o aprendizado do direito previdenciário. Apaixonado por musculação, leitura. Adora ensinar.

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