O texto debate a pertinência das leis que protegem as mulheres frente às transformações sociais, enfatizando a necessidade de uma legislação equitativa e sensível às nuances de gênero.
Aposentadoria com menos idade, menor tempo de contribuição, salário maternidade de 120 dias, prisão domiciliar com dependência presumida do filho, isenção de prestação obrigatória de serviço militar e tantas outras leis trazem proteção às mulheres há muito tempo.
Mas qual o critério adotado por cada uma para se legislar dessa forma? Vulnerabilidade, tarefas domésticas, menor compleição física ou proteção à maternidade?
De fato, as leis em sua grande maioria são elaboradas visando a regular condutas na sociedade; com estímulos, desestímulos, punições, homenagens e toda sorte de considerações a partir dos fatos sociais.
Então se presume que cada proteção legislativa sobre o direito das mulheres levou em consideração situações fenomênicas sobre sua realidade na época.
Entretanto, antes de se tentar desvendar as razões que levaram cada lei a conferir tratamento diferenciado às mulheres, é preciso hoje se enfrentar um novo tema: quem é considerado mulher.
Numa época em que a palavra de ordem é a não discriminação, parece que os discursos de liberdades absolutas individuais e a proclamação de igualdades de toda sorte tem confundido as noções elementares da realidade ao não se saber fixar exatamente os limites que definem a que ponto determinados gestos são estimulantes à igualdade desejada ou verdadeiras proliferações de desigualdade.
Os critérios que induzem a aprovação de leis diferenciadoras às mulheres têm se baseado em diversos pressupostos.
Mas vamos para a previdência. Mais precisamente para as aposentadorias.
No Brasil, antes da Constituição Federal de 1988, as mulheres trabalhadoras rurais sequer eram consideradas seguradas da previdência e, por isso, não podiam se aposentar, a menos que o marido fosse inválido.
Essa desigualdade foi remediada com a igualdade entre homens e mulheres clamada e proclamada pelo art.5º da CF/88, proibindo a discriminação de toda forma.
Mas nesse percurso de se traçar espaços igualitários, muitas normas protetivas podem acabar se tornando discriminatórias se não acompanharem as evoluções sociais. As mesmas evoluções que estimularam as primeiras mudanças, tão calorosamente evocadas.
Aqui na previdência, para as mulheres se exige menos idade e tempo de contribuição e se concede salário maternidade de 120 dias só a elas.
São, de fato, ainda proporcionais?
Dois fatores principais foram levados em consideração para essa tratativa diferenciada em relação aos homens: a conjugação do trabalho remunerado da mulher com os afazeres domésticos e os dados estatísticos de que a mulher ganha 30% a menos de que o homem.
A primeira, de que os afazeres domésticos são exercidos quase que integralmente pelas mulheres, tem sucumbido a medida em que há um grande avanço e equiparação delas na participação no mercado de trabalho e compartilhamento com os homens dos afazeres de casa.
Com isso, as tarefas diárias domésticas têm sido aos poucos exercidas em parceria com os homens, numa fase evolutiva social que deve ser acompanhada a olhos nus pelo poder legislativo e pelo executivo, inclusive para efeitos previdenciários.
Daí porque vários países já adotam os mesmos critérios de idade e tempo de contribuição para homens e mulheres.
O segundo motivo é sobre os dados estatísticos de que as mulheres ganham 30% a menos que o homem. Ainda em processo de equiparação, portanto, necessitando de leis igualmente proporcionais.
Eis aqui o ponto principal das próximas trajetórias executivas e legislativas proclamadoras da igualdade. Acompanhar cirurgicamente até que ponto as leis protetivas podem se tornar ou não discriminatórias em relação ao homem.
Estabelecer critérios de igualdade requer antes de tudo clareza, boa vontade e noções de justiça ao caso a ser analisado, em argumentos e decisões despidos da vontade quase que intuitiva de se proclamar parte de um grupo de justiceiros.
É natural que as sociedades passem por constantes mudanças e, antes de tudo, deveria ser natural também que soubéssemos enxergar cada uma dessas realidades e com base nelas fixar leis igualitárias, nas medidas de cada igualdade.
Tudo isso sem clima beligerante. De guerra. Mas de temperança, isenção de ânimos e principalmente sem o trem da alegria dos justiceiros de plantão.
Quanto à definição de quem é mulher – a biológica ou a que se declara mulher -, bem, deixamos para outro momento.
O assunto é polêmico e rende rodas de conversas infindáveis.
Continuemos estimulados a alcançar cada vez mais a igualdade entre homens e mulheres, na medida de cada particularidade de gênero, época e local, para que a tendência de equiparação não perverta o caminho e resulte justamente no oposto, a desigualdade.
Que a igualdade, antes de tudo, seja temperada.
Autor
Formado em direito pela Universidade Federal do Maranhão, aprovado nos concursos pra procurador de fazenda nacional e procurador federal. Foi assessor no TRF1. Procurador Chefe do INSS do Maranhão e membro da Equipe Nacional de Consultoria de Benefícios. Professor de direito previdenciário, criador de um método dinâmico, prático e eficaz para o aprendizado do direito previdenciário. Apaixonado por musculação, leitura. Adora ensinar.
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