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Incapacidades ululantes

A folha de pagamento mensal do INSS gira em torno de 70 bilhões de reais, alcançando quase 40 milhões de beneficiários. Desses, a maioria esmagadora…

A folha de pagamento mensal do INSS gira em torno de 70 bilhões de reais, alcançando quase 40 milhões de beneficiários. Desses, a maioria esmagadora é de benefícios por incapacidade, encabeçada pelo conhecido auxílio-doença, que hoje se chama auxílio por incapacidade temporária.

Só no mês de dezembro de 2023, dos 510 mil benefícios deferidos, 47,1% são destinados aos incapacitados temporariamente.

No Brasil, 03 tipos de benefícios são os mais concedidos em favor dos incapazes; o auxílio-doença, a aposentadoria por incapacidade permanente e o benefício assistencial ao deficiente.

Falemos do benefício reinante em todos os quadros estatísticos da previdência. O auxílio-doença.

Esse benefício tem seu marco histórico mundial datado de 1883 no II Reich Alemão, sob o comando do estadista Otton Von Bismarck, o pai do sistema previdenciário que leva seu nome, o Bismarckiano, e conhecido como o Chanceler de Ferro.

Na sua origem era limitado somente aos contribuintes e pago pelos empregadores. No Brasil, o sistema previdenciário tem feição diferente, mais alargado e beneficia até quem pouco contribuiu, como no caso de algumas doenças como HIV, cardiopatia grave e câncer ou mesmo acidentes.

Mas o novo panorama de elevadas concessões tem revelado vários cenários preocupantes, merecendo destaque a constatação de que as incapacidades dos brasileiros têm recebido toques de solavancos com o avanço das doenças mentais, como depressão, autismo e ansiedade.

O auxílio-doença teve sua nomenclatura alterada para auxílio por incapacidade temporária justamente porque não é um rol de doenças específicas que garantem direito ao benefício. Tem direito quem apresenta incapacidade; o que pode acontecer por doença, por acidente ou mesmo deficiência. Assim, muitas doenças que outrora não incapacitavam tanto, agora são o motivo da fila do INSS, o que se revela no crescimento dessa nova pandemia silenciosa mental.

E uma série de fatores contribuem para o elevado percentual que, diga-se, segue uma linha crescente. Falha de cumprimento de normas de segurança do trabalho, epidemias reiteradas de doenças tropicais, falta de saneamento básico que garanta um mínimo de água potável e agora a incidência de enésimos fatores globais e virtuais que potencializam as causas de ansiedade e depressão. Há quem diga ser o mal do século.

É por isso que hoje ouvimos falar de depressão e ansiedade com muito mais frequência e intimidade que em qualquer outra época.

Eis o inimigo mais difícil de se combater. A origem das doenças da mente. Já que a pessoa com doença mental manifesta alterações que consistem em anormalidades, sofrimentos ou comprometimentos de ordem psicológica ou mental, com mudanças significativas no comportamento, sem nenhuma razão aparente. E isso altera seu relacionamento com o mundo, impactando profundamente no funcionamento nos campos interpessoal, laboral e social.

Adicione a essa dificuldade os recorrentes casos de autismo que conferem direito ao benefício assistencial.

Essa crise da saúde mental que se alastra pelo mundo afora não se confunde com efêmeros sentimentos de medo, raiva ou tristeza. Potencializada pelo crescente isolamento social e comparativo com o fictício mundo virtual, doenças como depressão e ansiedade alcançam níveis de profundidade que limitam o comportamento do paciente a níveis de total apatia ou agravamento a ponto de gerar transtornos psicóticos e de humor.

Seu quadro degradante então ressoa efeitos em vários cenários, como trabalhistas, questões de saúde pública, econômicos, orçamentários e previdenciários.

Sob o prisma estatal acende um alerta em duas perspectivas. De um lado o dever de manter as condições orçamentárias para garantir e suportar o pagamento crescente desse benefício e, do outro, a necessidade maior de priorização de medidas preventivas que evitam levar o trabalhador à incapacidade.

Na seara previdenciária, o maior questionamento não é a falta de previsões legais que amparem a categoria dos que precisam da previdência. Essas já existem em grande proporção. A pergunta é até quando e quais as perspectivas se tem de esse cenário de alta demanda regredir.

Para os trabalhadores e contribuintes existem o auxílio por incapacidade temporária e a aposentadoria por incapacidade permanente. Para os não contribuintes – incluindo crianças – há previsão do benefício assistencial. E o INSS vem baixando os números de requerimentos acumulados.

Mas nessa ordem, a luta pela redução das filas do INSS deve começar bem antes das estantes de requerimentos aguardando análise. Deve voltar os olhos para o combate da origem de tanta causa incapacitante, principalmente as doenças mentais. E isso exige participação tanto do poder estatal quanto de toda a sociedade.

Afinal de contas, com menos incapazes, mais trabalhadores, mais geração de riqueza e menos impacto orçamentário. 

Por hora, o mais urgente. Combatamos as incapacidades ululantes.

Autor

Ibraim Djalma

Formado em direito pela Universidade Federal do Maranhão, aprovado nos concursos pra procurador de fazenda nacional e procurador federal. Foi assessor no TRF1. Procurador Chefe do INSS do Maranhão e membro da Equipe Nacional de Consultoria de Benefícios. Professor de direito previdenciário, criador de um método dinâmico, prático e eficaz para o aprendizado do direito previdenciário. Apaixonado por musculação, leitura. Adora ensinar.

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