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Formalidade agonizante

No Brasil, a taxa de informalidade já chegou a ser 38,8% da população ocupada…

No Brasil, a taxa de informalidade já chegou a ser 38,8% da população ocupada. Isoladamente, em 2019 por exemplo, onze Estados Brasileiros apresentaram o percentual acima de 50% de trabalhadores informais. Resumindo, quase metade da população economicamente ativa. Agonizante, esse cenário estatístico por si só surge praticamente como um espelho que ilustra vários vieses da realidade do país. E ainda sobra espaço para aventurar prognósticos em tantos outros aspectos.

Some tudo isso com a notícia de que o percentual de desemprego no Brasil leva em conta somente a quantidade de pessoas que procuram emprego dividida pelo número de pessoas economicamente ativas. Pois é, os 7,7% de desempregados anunciados para 2023 são somente aqueles que procuram empregos formais. Ou seja, não estão incluídos nos assoladores dados de desemprego o percentual estratosférico de trabalhadores informais que não procuram empregos formais.

Mas essa constatação não é o nódulo principal posto na mesa. E sim o fato de que a grande maioria dos trabalhadores informais recebem benefícios governamentais e o não registro de suas atividades – a tal informalidade – é elemento vital para se garantir a manutenção dessas duas rendas. A assistencial e a do trabalho informal. São mais de 21 milhões de famílias que recebem Bolsa-Família e outros mais de 05 milhões de beneficiários de prestação continuada – BPC, cujo um dos requisitos principais é não possuir renda per capita acima de R$218,00 reais no primeiro e de ¼ do salário-mínimo no BPC/LOAS. Ou seja, sem registro da renda, mais perto está de se garantir o benefício.

Há, portanto, um socorro urgente acolhido pelo poder público ao conceder benefícios dessa natureza em combate à assoladora pobreza extrema e ainda como um incentivo à circulação de recursos no mercado. Propósito nada menos que louvável. Afinal, quem precisa de ajuda não pode esperar.

Mas como diria o vocabulário popular, a cabeça tem o risco de encontrar o próprio rabo. É que os recursos que sustentam os programas sociais de combate à pobreza são em grande parte oriundos da participação da população ativa formal, que a fazem ao recolher seus impostos e contribuições pelo exercício da atividade remunerada. Ou seja, quanto mais empregos e rendas registrados – formalidades -, mais recursos angariados para sustentar programas sociais como esses.

Só que ao mesmo tempo que se combate a pobreza com a concessão de programas de transferência permanente de renda, há um implícito – talvez até explícito – incentivo de manutenção de informalidade, já que o registro de emprego formal implicará na declaração de renda e, por isso, na perda do programa social da maioria das famílias. Quem nunca conheceu alguém que só aceita trabalhar se não assinar a carteira?

O panorama então requer uma política de entremeio que estimule o ingresso formal no mercado da população economicamente ativa que hoje está na informalidade, com mecanismos que transitoriamente não estanquem os benefícios sociais. Hoje já existem políticas que acenam nesse sentido, como a contribuição simplificada para o microempreendedor, que inclui os feirantes, ambulantes, motoristas de aplicativo e várias outras categorias profissionais que transitam na informalidade, com recolhimentos de apenas 5% do salário-mínimo.

Mas ainda assim, o percentual de adesão não passa de 10% da população informal. A balança pesa para dois lados importantíssimos. A promoção da inserção do trabalhador na formalidade, com registro da Carteira de Trabalho e recolhimento de contribuições como autônomos, seduz pela garantia futura de proteção previdenciária em caso de invalidez, morte e até idade avançada, com aposentadoria, para não falar em fundo de garantia e seguro-desemprego.

Do outro lado, o trabalhador se vê encurralado na rotina diária de tentar produzir a renda de hoje para comer amanhã. E os benefícios assistenciais fazem parte desse cardápio. Imperativo, portanto, de sobrevivência. O espelho então não reflete o cenário de desemprego ou informalidade propriamente dito, mas de priorização do cidadão pela sobrevivência diária, enquanto não consegue comungar sua batalha de seu sustento e de sua família com a preocupação de ter uma proteção futura pela previdência.

O ideal seriam os dois. Aliás, três. Sobrevivência, vivência e previdência. Mas os dados revelam que estamos ainda no primeiro estágio, em que um auxílio assistencial de qualquer valor faz toda a diferença. E para quem dele precisa, a previdência vai ter que esperar. Por hora, a formalidade segue agonizante.

Imagem: Adobe Stock

Autor

Ibraim Djalma

Formado em direito pela Universidade Federal do Maranhão, aprovado nos concursos pra procurador de fazenda nacional e procurador federal. Foi assessor no TRF1. Procurador Chefe do INSS do Maranhão e membro da Equipe Nacional de Consultoria de Benefícios. Professor de direito previdenciário, criador de um método dinâmico, prático e eficaz para o aprendizado do direito previdenciário. Apaixonado por musculação, leitura. Adora ensinar.

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